7 de jun. de 2006

Inventou o inventar e ventou

Pois já foi nosso tempo de línguas várias, línguas vindas, oriundas, descidas e subidas, línguas de muitos paladares e muitas distintas palavras. Mas aqui, com o tempo, toda essa infinidade de línguas múltiplas precisou lamber-se umas as outras, misturar-se, inchar os sentidos, alargar nomes de coisas, somar palavras. Aqui toda aquela riqueza de línguas de fala tornaram-se em sotaques. Transformamos assim nossos dialetos em sotaques. E aí ganhou-se esses jeitos todos de falar, mas não veja mal nisso: não corrompem a língua, de contrário, a seduzem, nesse caminho traquejoso, com ritmos, entonações novas para aquelas mesmas palavras de antes.
Explicação de Seu Feidão sobre a língua

Na cabeça de Vidigal Primeiro, dono daquela Fábrica no Brás, sotaque era um despautério, um pecado, uma lascívia. Era palavra sendo desnuda, desavergonhada, sofrendo e contorcendo-se pelos limiares da boca, arisca, afoita, anasalada, às vezes quase sexuada. Vidigal achava aquilo um completo despropósito. Não permitia sotaques ali, na fábrica. Era como se alguém mostrasse suas vergonhas e ao falar passeando pela fábrica, desfilando seu sotaque, era como se desfilassem suas vergonhas, seus próprios corpos desnudos. E aquilo agredia de alguma maneira, não se sabe como, a crença e o respeito dos demais. Vidigal não permitia o sotaque. Vidigal queria o respeito imperando na Fábrica. Na Fábrica se falava a língua seca.

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