6 de set. de 2007

madrugada

Vejo o esforço quase autônomo de minhas mãos buscando delinear no vento um jeito de convencer-me de algo que... eu não saberei descrever. É como se meu corpo estivesse argumentando numa agitação algo que é anterior a mim. Na verdade, que ordem é essa? Por quê creio que isso que delega consciências e razões é anterior? É inevitável, não sei pensar de outra forma. Mas é isso: é porque estou a pensar. Eu sei que parece óbvio. Na verdade, eu estou escrevendo isso para mim mesmo, porque vai ser muito díficil dormir sem algum tipo de palavreamento para isso que me suscede. Algo em minhas mãos realmente está buscando indicar para um lugar onde não conseguirei chegar com a razão. É um tremor de noite desdormida, esse estado estranho onde os olhos são madrugadas e mesmo recebendo os primeiros risos do sol, não é um sol, é um sol madrugado, escrevo essas palavras madrugadas, enfim. Entre uma frase e outra solto as mãos e deixo-as voltarem ao seu processo. Sinto que essas mãos começam a habitar um terreno do qual eu pouco participo. Talvez ainda seja eu. Provavelmente sim. Essa agitação nômade vai caminhando pelo meu corpo, incitada pelas mãos. A consciência começa a questionar-me coisas estúpidas. O que bebi? O que ingeri? Eu não gostaria de responder, mas a consciência também procede de maneira semi-autônoma, como se o questionamento ecoasse incomodando até eu me dispor a responder. Confesso que há um pouco de álcool, uma cachaça mineira. Mas não é esse o cerne, reivindico, numa discussão comigo mesmo. Tento preservar o que sou em meio a todas essas partes independentes de mim. É díficil, não consigo. Porque, afinal de contas, essas são as minhas mãos. Ainda. E com algum esforço, a consciência já está novamente ocupada de entender esse frenesi de mim. É tudo um devaneio, uma ilusão, um estado alterado de consciência, uma coisa qualquer. Mas que alteração? Esse é o problema. Eu estou aqui. E a cada frase eu paro, e meu corpo parece ser muito mais eu do que eu jamais fui. Acabei de ir até a sala, o sol incide e estou bronzeado de madrugadas. Existe alguém antes de mim, com todo esse corpo e essas mãos, que também pode ser eu. A consciência não é vilã de nada. Ela está aqui, meio boba, sem entender muita coisa. E é isso. Numa madrugada repleta de esforços por sentidos, conexões sedentas por desfechos, saídas, conclusões...o dia amanhece e meu corpo trás um suspiro. Preciso seguir minhas mãos, para não me perder nessa vida tão sem sentido.

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