7 de jan. de 2010

Cabeça Branca

Lourival tem aquele cabelo grisalho e a pele anoitecida, com um bigode de vagabundo. Sempre gesticulando muito, foi da orla até o Pelourinho falando. De ínicio, achei que era mais um cobrador de ônibus safado. Adorava mexer com as mulheres. Num exercício inédito, tentei entendê-lo antes de todos os meus julgamentos.
- Ô minha querida, você é gordinha, mas tá ajeitadinha, hein?
Não demorou muito para eu entender que Lourival só elogiava as mulheres desprovidas do repertório convencional da beleza. Um apressado diria: as feias. Minha surpresa não estava nisso, uma vez que gosto é algo amplo, cabe tudo. A questão era a reação que ele provocava nessas mulheres. Lourival era praticamente um investidor tácito na auto-estima daquelas mulheres. Não sai da minha cabeça o sorriso da gordinha. Um sorriso bonito, gordo mesmo, de ponta a ponta.
- Toda mulher tem uma beleza guardada.
No sol do dia-a-dia Lourival era cobrador de ônibus, compositor dessa opereta para as mulheres desajustadas pela beleza tradicional. Na lua das noites ímpares, Lourival era Cabeça Branca, fazedor de sambas tristes na Barroquinha.
- Em terra de carnaval, a tristeza virou quase uma feiura.

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