27 de fev. de 2007

tris, tris, tristeza, minha alteza.

Encaixotou metade da vida. A outra metade, enfiou meticulosamente em sua grande mochila. Aquela mochila era praticamente sua memória. Nas laterais, já passaram meias de duro inverno, conchas de doces praias, cuecas sujas de leve amor. Os homens enraizados em seu cotidiano esbravejam por alguma liberdade, folga nos contratos e compromissos. Ele observava com pouca atenção esses homens, ainda com sua dificuldade em ver a beleza de estar exatamente assim: no limbo dos rumos, na tranversal das perspectivas, com o hálito da cachaça branca daquele último boteco. Perdido só está, aquele que em algum momento obteve direção, rumo, ordenamento. Dessarumando o passado, sentia-se novo em folha, como se tudo fosse possível. Trocaria essa infinidade angustiante de possibilidades, os elogios nublosos e os tapinhas nas costas recheados de bons futuros, por um punhado de vida que lhe coubesse a mão. E fosse deslizando entre os dedos, onde pudesse ir gradualmente mergulhando e desesperando-se com a vida, sabedor de cada grão descorrido e sem segunda chance para ser vivido. Sem esse punhado, nas mãos vazias, escorriam rios de uma solidão a transbordar os dias. Sentia a solidão como uma aceleração brusca no relógio da vida, mas que passa cada segundo numa profunda lentidão, como se uma vida inteira fosse capaz de ser corrida em cada uma das brechas. Na solidão se envelhece. Nos outros instantes, se amadurece.

Colocou mais uma vez a mochila nas costas e partiu. Seu limite era sempre a tentativa de não incomodar o cotidiano desses gentis que o abrigava. Ao sinal de um desconforto, as alças da mochila tremiam em sede pelas costas. Aquela mochila era mesmo sua memória. Partiu, mais uma vez, ansioso por um novo guarda-roupas.

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